O evento terá como lema “Agroecologia e Democracia unindo campo e cidade”, sendo essa uma etapa preparatória ao IV Encontro Nacional de Agroecologia (ENA)

Gilka Resende e Patrícia Tavares¹

Territórios de resistência ao agronegócio, movimentos sociais e organizações da sociedade civil do Centro Oeste promoverão, pela primeira vez, um evento regional preparatório ao Encontro Nacional de Agroecologia (ENA), cuja quarta edição ocorrerá daqui a dois meses em Belo Horizonte (MG). Cerca de 100 representantes de entidades do Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás e do Distrito Federal se reunirão em Brasília, entre 4 e 6 de abril, para a realização do Encontro Regional de Agroecologia (ERÊ) – Centro Oeste. Assim como o IV ENA, organizado pela Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), a etapa regional terá como lema “Agroecologia e Democracia unindo campo e cidade”.

“Sempre conseguimos realizar eventos estaduais, mas é a primeira vez que reuniremos representantes de todos os estados do Centro Oeste para levar os debates da região para o ENA. Esse sempre foi um desafio. Entendemos que a agroecologia se faz de forma coletiva. Por isso, é importante fazer encontros, debates e intercâmbios de saberes entre os territórios”, expõe Cidinha Moura, coordenadora da FASE no Mato Grosso. Nesse sentido, duas redes apresentarão suas experiências de articulação de territórios e inciativas de agroecologia: o Grupo de Intercâmbio em Agroecologia (Gias), do Mato Grosso, e a Associação de Produtores Orgânicos de Mato Grosso do Sul (Rede APOMS).

(Foto: Rosilene Miliotti/FASE)

Ganha destaque também o papel das mulheres na agricultura familiar de base agroecológica. “Teremos uma plenária feita por mulheres com o objetivo fortalecer o lema ‘sem feminismo não há agroecologia’. Com essa compreensão, pautaremos o papel das mulheres no cultivo dos alimentos realmente saudáveis”, destacou Cidinha. Ela explica que o evento quer valorizar também cultivos adaptados a cada localidade. “A ideia é dar visibilidade para alimentos tradicionais do Centro Oeste: cumbaru, pequi, plantas medicinais do Cerrado e do Pantanal, dentre outros. A discussão será sobre ‘comida de verdade’, ou seja, comida produzida com respeito aos agricultores e agricultoras, sem a contaminação por agrotóxicos, com alimentos que fazem parte da cultura e da vida das pessoas”, completa.

Bárbara Loureiro, do setor de produção do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), lembra que a alimentação é um tema central para o diálogo entre as populações do campo e da cidade. “Os territórios camponeses têm uma enorme responsabilidade na produção de alimentos saudáveis para toda a população. Esse é um objetivo que o modelo do grande capital não consegue cumprir. O agronegócio produz commodities agrícolas. É a agricultura do campo que produz a alimentação diária de quem está na cidade”, afirma.

(Foto: Andrés Pasquis/Gias)

O ERÊ Centro Oeste também será uma oportunidade de debater o uso da água. Recentemente, a Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb) começou a interromper o fornecimento por 24 horas em algumas regiões do Distrito Federal. O anúncio da situação crítica de escassez hídrica foi feito ainda em 2016, realidade que se repete em outras regiões metropolitanas no país. Geralmente, razões como a falta de chuvas, o desperdício e o crescimento urbano acelerado são alguns dos possíveis motivos apontados para o desabastecimento de água nas cidades. Porém cabe lembrar que, de acordo coma Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), aproximadamente 70% da água disponível no mundo são voltados para a irrigação. No Brasil, esse índice chega a 72%.

Bárbara explica que grupos que constroem a agroecologia se preocupam com isso e têm uma relação distinta com esse bem comum imprescindível à vida. “A agroecologia traz esse debate: o de que a água não é mercadoria, não deve ser uma propriedade privada. Todos e todas devem ter acesso à água. Pensando nisso, a agroecologia inclui a reutilização da água, a conservação de mananciais, o reflorestamentos das margens de córregos, de lagoas, dentre outras ações”, diferencia Bárbara. E completa: “a agroecologia consegue olhar para todo o sistema e seus ciclos”.

(Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil)

Além da troca de saberes na plenária das mulheres e no debate sobre redes que reúnem grupos de agroecologia, a programação do ERÊ Centro Oeste contará com convidados e convidadas que debaterão a conjuntura política, econômica e ambiental no país, dando ênfase às lutas sociais da região. Também estão previstas rodas de conversa sobre: direitos territoriais, reforma agrária, água e impacto nas mudanças climáticas; construção social de mercados de alimentos e a relação entre consumidores e consumidoras do campo e da cidade; comunicação, cultura, construção de conhecimento e educação no campo; e juventudes na agroecologia.

[1] Integrantes da FASE e do Instituto Federal de Brasília (IFB), respectivamente. Ambas integram o Coletivo de Comunicação e Cultura da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA).

 

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